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segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

De Drummond à eleição de Barack H. Obama


“Quando nasci um anjo torto, desses que vivem na sombra, disse: ‘vai Carlos ser gauche na vida’”. Nesta estrofe de abertura de seu belo poema de sete faces, o nosso engajado Carlos Drummond de Andrade (1902 -1987), tendo a pura intenção de nos fazer pensar sobre nossa pobre vida, fala-nos de sua, não desejável, vocação.

Dentre as traduções do francês, ‘gauche’, o mesmo tem o significado de esquerdo (canhoto em relação à mão), desajeitado e/ou torto. Em nosso bom cearencês, pode-se traduzir esse termo por: - “cabra da peste ou azarado” (aportuguesando, mas, sem perturbar Rui Barbosa ou franzir a careca de nosso poeta, Pe. Oswaldo Chaves). Neste caso, seria, uma pessoa que vive dependendo do ocaso.
E, não por acaso, todas essas palavras aqui alencadas, dão o sentido de oposição a algo, de falta de sorte e de andar na contramão de alguma coisa.

Seria a vida um mar de contradições, ou com o seu gauche, Drummond expressa apenas o pessimismo caro à maioria dos poetas? Acredito que não, pois, ao longo da labuta de tirar as pedras do meio do caminho desta vida breve, encontramos em Drummond, muita sabedoria e realismo frente aos determinismos e profecias que abarrotam nossas cabeças, e que infelizmente, muitos acreditam.

Partindo-se de Itabira (cidade onde nasceu o nosso poeta em 1902) rumo a América do norte, o nosso foco mira-se desta vez na vitória do democrata Barack Hussein Obama, para a presidência dos Estados Unidos da América.
O otimismo e a compaixão que este acontecimento despertou na humanidade, já cansada das burrices e maldades cometidas por seu antecessor, George W. Bush, é uma prova do quanto devemos dar vazão aos sonhos e a esperança.

Sua posse no dia 20 de janeiro de 2008, superou todos os recordes de participantes para esse tipo de celebração. A cidade de Washigtom foi invadida por uma multidão de cidadãos e estrangeiros que eufóricos bradavam o primeiro negro a se presidente da maior potencia do mundo. Só vimos algo parecido por esses lados, quando o nosso Lula, que se dizia operário, ex-torneiro mecânico, chegou a presidente do Brasil, pela primeira vez.
Na profundidade de seu pensamento utópico, por um mundo melhor (com justiça e paz), o centenário bispo Dom Helder dizia que frente às barbáries que acometiam a nossa época e a monstruosidade dos desafios: “é preciso acreditar contra toda desesperança”.
Parece-nos, ter sido este o sentimento que alavancou toda essa onda de esperança e anseios coletivos que resultaram na colocação de um senhor de cor negra, descendente direto de estrangeiros e não nascido em berço de ouro como costumam ser eleitos os governantes da casa Branca, bem como são escolhidos os nossos ‘governantes’ profissionais. “Algo que só acontece na América”, tentou justificar dona Michelle Obama, sua esposa.

“Mundo mundo vasto mundo”, desta vez o poeta itabirano (por isso: “é triste, orgulhoso: de ferro”), nos interpela que é preciso não olharmos somente para um dos lados, o dos resultados (ou seja da vitória), mas, faz-se necessário olharmos os meios que envolveram a busca por este fim.

Olhando os meios, podemos até desmistificar representações, muitas delas falsas, criadas em torno deste acontecimento. Em comparação com a historia recente do Brasil, vamos entender, por exemplo, fatores de nosso cotidiano, como o vergonhoso ‘mensalão’ do governo, bem como o processo ilusório, de hiper-popularidade (por três vezes bate recorde) do presidente Lula.
Primeiro devemos entender que não foi apenas por mérito pessoal, por sorte ou por vontade popular, que Barack Obama conseguiu tal façanha. Dentre os motivos que o favoreceram, não todos dignos, pois, em sua totalidade foram devidamente calculados segundo a ordem capitalista do lucro e da dominação, podemos apontar: o descrédito quase que total do presidente Bush como líder mundial naquele momento, o fato de se fazer uma campanha milionária (talvez a maior da história dos EUA - US$ 750 milhões) e a contratação dos melhores marqueteiros do país, que cuidaram de tudo, segundo as regras preestabelecidas para se iludir e conquistar as massas. Todos esses são fatos que devemos refletir!

Então senhores, além da pura semelhança com a jogatina do PT para vencer as últimas eleições presidenciais, o que temos para comemorar com a eleição de Obama? Não foi tudo divinamente planejado, como fazem todos os demais líderes quando querem conquistar o poder dentro desse sistema capitalista.
Uma saída neste caso é dizer que Obama venceu, por sua inteligência brilhante, seu carisma e a bela atuação no senado. Sarah Palin, a vice de seu opositor John McCain, tira o véu dessa superstição, ao afirmar que durante a sua permanência no senado, embora, já tendo escrito duas autobiografias em sua carreira, Obama: “Jamais aprovou uma lei”.
O problema da humanidade é que ao se deparar com acontecimentos deste tipo, algumas pessoas têm o costume de fixarem nele toda a sua atenção e esperanças, ao ponto de causar cegueira. Esquecem-se de que, por mais que nos esforcemos, esses são frutos dos mesmos interesses, e, as raízes são as mesmas que em algum momento causaram algum tipo de sofrimento, dor e opressão para diversas pessoas.
A solução não é fugir e se omitir, é antes, tentar esclarecer as dúvidas que cercam o problema e deste modo descobrir o jogo de interesses que o cercam. Que interesse tem o PT em vestir Lula em paletós importados, em vez apresentá-lo com barba e usando roupas de operário, como fazia antes? Qual sua intenção em distribuir recursos assistencialistas para o maior número de famílias?
O momento que os EUA padecia, proporcionou eleger alguém parecido e apoiado pelo ‘tirano e cínico’, Bush ou Obama dava maiores esperanças, embora de cor bem distinta?
Em resposta às perguntas, sabemos que a maioria dos pobres, além de estarem mergulhados em ócio excessivo e negativo, frente ao dinheiro do presidente, ficam cegos à macro-corrupçao de seu governo. Querem saber de pão, que se dane a justiça e a cidadania. e continuam a divagar: - “para que se esforçar, trabalhar ou estudar, pois ter o que comer é o que importa”!
No caso de Obama, certamente se calculou que um candidato de cor negra, seria mais fácil de causar uma comoção nacional. Era ele, naquele momento, certeza de retorno financeiro e das regalias que o poder oferece; para os acionistas e demais beneficiados valeria a pena patrocinar!
Obama poderá não ser a solução à crise, nem tampouco a porta para ações mais humanizadas entre os Estados Unidos e o resto do mundo. Ai, neste caso quero ser um falso profeta.
A sua posição leviana frente à prática do aborto e a dificuldade que teve para aprovar no senado o pacote de estímulo econômico (no valor de US$ 838 bilhões). São estas intuições, embora pessimistas, que podemos citar para sermos realistas.

Fechar guantánamo, retirar tropas do Iraque, são ações que mexem apenas com a ponta de Iceberg de devassidões que os EUA têm causado à humanidade, inclusive, ai se inclui a (in) responsabilidade direta pela a atual crise financeira.
Ouvindo Zeca Baleiro (cantor e agora escritor maranhense), e, tendo-se consciência das dificuldades que Obama vai enfrentar concordamos que: “não é necessário que Obama seja o messias, o redentor de todas as mazelas humanas como o mundo agora o trata. Basta que ele seja Barack Hussein Obama Jr., o primeiro presidente negro dos Estados Unidos da América. Não um negro de alma branca, apenas um negro com alma”(Istoé, nº2047).
Apesar dos avanços que a democracia diz ter alcançado, reportamo-nos a Drummond. E, não é que seu anjo estava certo: “tinha uma pedra no meio do caminho, no meio do caminho tinha uma pedra”.




Joao B. Diniz é seminarista da diocese de sobral e cursa teologia no ITEP.

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